Wednesday, June 06, 2007

Quero ser cineasta

Uma entrevista com Steven Richter
Por Katia Kreutz

Muita gente quer fazer filmes, mas como dar o primeiro passo? Steven Richter, diretor da Academia Internacional de Cinema, fala sobre o que faz um bom cineasta. Não basta ter boas idéias. É preciso, além de talento, aplicação. Ele fala também sobre as diferenças do mercado americano e brasileiro para quem está começando, sobre o impacto das novas tecnologias e a importância da qualificação profissional para quem quer trabalhar nessa área. Quem aprende a fazer – e faz – está no lugar certo, na hora certa.

Se uma pessoa quer se tornar cineasta, como deve começar?
As pessoas começam suas carreiras no cinema de diversas formas. Uma das coisas interessantes de se notar na biografia dos cineastas é que eles em geral tiveram os mais variados tipos de background. Eu estudei filosofia, por exemplo, antes de partir para o cinema. Nos Estados Unidos, as escolas de cinema são muito importantes. Muitos dos melhores cineastas vêm dessas escolas, e certamente elas ajudam a indústria cinematográfica americana gerando novos talentos e mão-de-obra.

O que é importante saber para se tornar um bom diretor?
Como bons diretores vêm dos mais variados tipos de background, a questão não é tão simples. Acredito que o bom diretor é aquele que entende o suficiente sobre cinema para fazer um filme como ele precisa ser feito. O bom diretor deve saber o máximo possível sobre as outras funções da equipe. Deve conhecer o departamento de arte, fotografia, produção e pós-produção. Deve saber como comunicar suas necessidades à equipe, e ser capaz de entender o que a equipe lhe diz.


Como os alunos aprendem na AIC?
Aprender fazendo é uma parte importante da metodologia da AIC. Os alunos produzem diversos curtas-metragens, tanto em vídeo quanto em película, de complexidade variável, ao longo de dois anos. E eles também têm a oportunidade de fazer um longa-metragem. A AIC ensina o que chamamos de teoria aplicada. Isso significa que em nossas aulas ensinamos teoria junto com a prática, mostramos referências, e a partir delas os alunos praticam. Fazemos isso em todas as áreas, incluindo direção, fotografia, edição, direção de arte e som. Analisamos a história e a linguagem, e depois mostramos como fazer.

Quais são as diferenças em termos de oportunidade para um jovem cineasta nos Estados Unidos e um jovem cineasta no Brasil?
Bem, os Estados Unidos têm uma indústria enorme. Cinema e televisão são um dos três maiores produtos de exportação. Além disso, nos Estados Unidos há um grande mercado independente, então realmente há diversas frentes de atuação para quem está começando uma carreira, mas isso não quer dizer que não seja difícil. É um mercado extremamente competitivo. Um aspecto maravilhoso do Brasil é que parece estar se encaminhando para um grande momento. Aqui há uma nova geração de talentos que está produzindo ótimos filmes, e fazer parte de uma geração que está por vir é algo muito empolgante. À diferença dos Estados Unidos, onde é mais difícil encontrar identidade artística, pois o mercado já vive uma espécie de esgotamento, o Brasil tem um terreno amplo para explorar.

Qual é o papel das escolas na indústria cinematográfica?
Escolas de cinema têm um impacto considerável na indústria. Elas atuam como espaços em que se desenvolvem novos talentos, profissionais qualificados, e também funcionam como produtoras. O sistema de escolas de cinema salvou Hollywood quando revelaram jovens cineastas como Scorsese, Lucas, Spielberg e Coppola, que vieram de escolas como a NYU, USC e UCLA. Atualmente grande parte dos talentos ainda vêm de escolas de cinema.
No Brasil também. Muitos dos principais profissionais do mercado vêm das melhores escolas de cinema.


Você acha que a AIC pode vir a causar um impacto no cenário cinematográfico brasileiro? Que tipo de impacto?
Acredito que sim. Muitos de nossos ex-alunos estão trabalhando na área hoje em dia. Alguns deles estão tendo seus filmes aceitos nos maiores festivais nacionais e internacionais. A AIC tem o objetivo de treinar jovens talentos como cineastas independentes. Pessoas que possam sair da escola com o conhecimento de que precisam para realizar filmes. Que saibam montar uma equipe e produzir um filme do começo ao fim, sem ter, necessariamente, de estar ligado a uma grande produtora. Mas, que ao mesmo tempo, tenham capacidade profissional para trabalhar numa grande produtora, se tiverem esse intuito.Uma das propostas-chave da AIC é essa: colocar as ferramentas adequadas nas mãos de pessoas que irão sair da escola e fazer filmes, dentro e ao largo do mercado.


O que significa ser inovador no cinema nos dias de hoje?
As possibilidades em cinema estão sempre se expandindo. Um cineasta, para ser inovador, precisa ser capaz de mostrar às pessoas coisas novas, essas pessoas precisam se interessar e gostar do que estão assistindo, e, como em todas as grandes formas de arte, isso precisa ser aberto às pessoas comuns também. Muita gente tenta separar arte de entretenimento, mas o grande artista é aquele capaz de dialogar com ambos. Mas quando se fala de inovação, deve-se sempre pensar em novos meios de contar histórias. E isso também inclui tecnologia. O formato em vídeo, YouTube, etc, por exemplo. Mas não concordo com aqueles que confundem inovação com o uso de novas tecnologias, e se justificam dessa forma, dizendo que qualquer outra opção é coisa do passado. Muitos cineastas que não têm recursos ou técnicas para filmar em película dizem que a película é ultrapassada. Isso simplesmente não é verdade, já que 99% dos filmes ainda são feitos em película, e, portanto, está longe de ser algo ultrapassado. Os departamentos de cinema nas escolas devem também filmar em película, para proporcionar aos seus alunos uma experiência educacional condizente com a realidade, pois assim que os ex-alunos colocarem os pés em um set de filmagem, provavelmente irão filmar em película.
Como espectador, a maior parte das coisas que eu vejo no cinema não acho estimulantes. A cada ano vejo menos filmes que eu poderia considerar inovadores. Filmes como "Dogville", "Caché" e "Marie Antoinette" são alguns desses filmes recentes que se podem dizer inovadores, cada um a seu modo. Gosto da visão de empresas como a Palm Pictures e revistas que trazem suplementos em DVD, com novos talentos, como a Res Magazine.

Como a tecnologia se aplica ao cinema feito hoje? É possível fazer filmes competitivos de baixo orçamento?
Muitos bons filmes têm sido rodados em vídeo e em alta definição. Principalmente a alta definição está se tornando uma mídia cada vez mais usada, ganhando mais respeito como uma ferramenta legítima na forma de se fazer cinema.
O problema, na verdade, não está na mídia usada, mas no filme em si. Se você é um bom cineasta e faz bons filmes, as ferramentas acabam não tendo tanta importância. Você é capaz de ultrapassar os obstáculos do formato digital. Mas isso também tem muito a ver com atitude. Um bom diretor é alguém cuja visão vai além do set, e que fará o que for preciso para que seu filme seja produzido. Um aspecto do vídeo é que todo mundo tem acesso a ele, e isso é ao mesmo tempo positivo e negativo, uma vez que democratiza o cinema, mas também inunda o mercado com filmes ruins. Quando você manda um filme gravado em vídeo para um festival, as pessoas tendem a encará-lo com desdém. Quando um filme é rodado em película, pelo menos sabe-se que houve algum dinheiro investido nisso e o nível de qualificação é um pouco mais alto. Isso é o bastante para separar o cara que compra uma camcorder no Fast Stop, liga a câmera e capta uma imagem apertando um botão, de um outro que precisa ser treinado em fotoquímica e câmera de cinema para ser bem sucedido. Tendo dito isso, é claro que um profissional de cinema também pode fazer muita coisa usando uma câmera de vídeo.

Como a tecnologia se relaciona com a visão criativa?
Acredito que a inovação está diretamente relacionada com a liberdade. Quanto mais liberdade uma pessoa se permite, mais inovadora ela se torna. A liberdade que o vídeo oferece é incrível. Desde o preço do equipamento, o fluxo do trabalho, com equipes de poucas pessoas, até a mobilidade de distribuição via internet.

Essa história de câmera na mão

Depoimento de um ex-estudante de cinema sobre o que é ser estudante de cinema
Por Katia Kreutz*


Não é de hoje que existe polêmica sobre como se deve aprender a fazer cinema. Em qualquer campo criativo, a função do instrutor é apresentar técnicas e possibilidades artísticas e de reflexão que ajudem a desenvolver o talento do artista. Arte e técnica são inseparáveis. Na criação de filmes, não é diferente – há muito o que se aprender.

Mas até que ponto uma escola de cinema pode atender às expectativas do aspirante a cineasta, no sentido de inserí-lo no mercado de trabalho? O que exatamente pode oferecer?

De acordo com a Wikipedia, enciclopédia virtual, uma escola de cinema (ou film school) pode ser definida como o “termo genérico para qualquer instituição educacional dedicada ao ensino da técnica cinematográfica, incluindo, mas não se restringindo à produção de filmes, teoria e roteiro”. Parece simples, mas cada palavra dessas: “técnica”, “produção”, “teoria” e “roteiro” tem um mundo enorme por trás de si. Nos Estados Unidos ou na Europa, os programas de filmmaking incorporam em seus currículos treinamento prático, como aprender a usar uma câmera ou software de edição. No Brasil, a maioria dos programas de cinema de nível superior abrem uma parte significativa da carga horária também para teoria.

Enquanto o gênio, ou talento (ou como quer que se chame uma pré-disposição natural para fazer algo bem feito) em geral nasce com a pessoa, a técnica para seu aperfeiçoamento precisa ser apreendida. Embora uma escola de cinema não seja capaz de transformar de um momento para outro um aluno no próximo David Lynch, ela pode e vai lhe ensinar enquadramento, continuidade, montagem, iluminação, e uma série de outras técnicas úteis em qualquer set de filmagem do mundo profissional. Para quem quer se especializar, esse conhecimento técnico é indispensável e alguma qualificação é essencial.

Como se aprende o ofício – se numa escola, ou como autodidata – é outra questão. Se por um lado, diretores como Martin Scorcese, Francis Ford Coppola e George Lucas vieram de renomadas escolas de cinema (NYU, UCLA, USC), outros cineastas premiados como Quentin Tarantino e Paul Thomas Anderson nunca tiveram nenhum tipo de educação formal.

Não há receita para se chegar ao topo. Como o cinema aparenta ser um universo tão atraente, é óbvio que tem muita gente querendo trabalhar nele. Os obstáculos para se entrar nessa área são muito maiores do que se imagina. É difícil conseguir uma chance, mesmo para os mais talentosos. Uma das vantagens das escolas, é que fazer parte de um programa de cinema possibilita que se crie uma rede de contatos, sejam com professores (profissionais da área) ou ex-alunos que agora atuam profissionalmente. Os colegas de classe também são uma fonte valiosa de conexões. Ao longo de um curso extensivo você faz parceiros que podem se tornar seus futuros colaboradores e colegas de equipe. Se eventualmente um desses colegas for bem sucedido, você ainda corre o risco de ser contratado por ele.

Mesmo durante o curso, o retorno que se recebe de professores e colegas, pessoas com um olhar apurado, é sofisticado e inteligente. Essas são as pessoas irão ajudá-lo a melhorar o seu trabalho, de modo que, com alguma perseverança e boas idéias na cabeça, você possa se tornar um cineasta competente e quem sabe um dia – famoso. É quase impossível encontrar um grupo de pessoas com essa consciência fora de um ambiente escolar. As dicas e conselhos desse público específico podem ser úteis para o resto de sua carreira.

Além disso, bons professores tendem a incentivar o aluno a trabalhar duro e a conseguir o melhor de si, ousar mais do que ele ousaria sozinho, fazendo filmes com seus amigos. Mesmo para aqueles que pretendem criar filmes experimentais de linguagem inovadora, ignorar que existe uma história e teoria do cinema para se aprender é ingenuidade. Há sempre alguém que sabe mais do que você, e com quem você certamente poderia estar aprendendo a realizar um trabalho mais consistente e interessante.

No cinema, ter um diploma ou certificado não parece ser tão importante como em outras profissões. De qualquer forma, a indústria vê com bons olhos os jovens profissionais que se formaram em instituições de qualidade, com profissionais respeitados. A credibilidade ajuda o iniciante a se estabelecer no mercado.

Interessa também o que você realizou. Para isso é necessário tempo e dedicação, além de uma porção de equipamentos que não são nada fáceis de se obter a preços módicos. Se você opta por uma escola de cinema que lhe ofereça toda essa estrutura, de quebra poderá contar com um grupo de colegas com os mesmos objetivos, dispostos a levar o projeto adiante. É muito difícil fazer tudo por conta própria, por mais independente que você seja. Uma escola lhe oferece o espaço para colocar suas idéias em prática.

E acima de tudo, uma escola lhe permite errar. Fazer e refazer. Oferece continuidade, a segurança de apostar na carreira, já que você investiu esforço, tempo e dinheiro nisso. Por que não usar o dinheiro que você gastaria num longo curso de cinema para comprar sua própria mini-DV e um potente Macintosh? Porque uma escola é muito mais do que as maravilhas tecnológicas a que você terá acesso. É a possibilidade de trabalhar com película sem culpa, ter estúdios apropriados ao invés do quintal da sua casa, e principalmente contar com a orientação de quem entende do assunto. São essas as únicas pessoas capazes de mediar seu ego, que já alcança proporções cinematográficas mesmo quando você ainda está se aventurando em filminhos de celular.

Uma escola de cinema também dispõe de um acervo de livros e filmes que você nunca encontraria na locadora da esquina. E essa mesma escola vai tentar divulgar seu trabalho além do seu círculo de amigos, em exibições e festivais que tragam visibilidade a pequenas experiências cinematográficas que em geral seriam simplesmente ignoradas. Afinal de contas, ninguém faz filmes apenas para receber os elogios da própria mãe.

Aprender fazendo – pode ser uma faca de dois gumes. Se a Internet e o cinema digital oferecem a qualquer um a chance de fazer filmes, também estimulam a proliferação de lixo. Aprenda fazendo, mas aprenda com quem sabe o que está fazendo. O futuro do cinema no Brasil e a própria criação de um mercado auto-sustentável dependem de agitadores culturais, de pessoas ou instituições que incentivem a produção cinematográfica. Em resumo, a não ser que você se considere o novo Tarantino, escolha uma boa escola de cinema.




* Katia Kreutz formou-se nos Programas Anuais de Cinema da AIC, Filmwoks e Craft, e dirigiu os curtas-metragens Linhas, Artefato Violento e Ininterrupto.

Friday, December 29, 2006

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Wednesday, August 02, 2006

Harold de Campos' Calcas co de abobora (from Rattapallax 12, Portuguese)